Para preencher o vazio

Este é texto é uma continuação (feita em 07/2021) mais filosófica do "O Que preenche o Vazio?": 

Um vazio (seja ele afetivo, existencial ou outro) é natural? Possivelmente não enquanto a existência persistir… O natural seria preenchê-los, no mínimo, em algum momento. O vazio é a “falta de” e pode ser ocasionalmente notado desde a “abstrata” mente humana até os confins do “concreto” universo/ espaço-tempo conhecido até então. 

Quando faço a comparação de aquisição e desenvolvimento racional/ empático com o processo de expansão mental ( neste texto, por exemplo: https://nea-ekklesia.blogspot.com/2021/05/3-be-ba-da-realidade-o-que-e-ciencia.html ), também considero possível relacionar este fenômeno com o processo de surgimento e desenvolvimento de todos os corpos do universo. Claro, é uma relação bem generalizada, mas há semelhanças entre variados sistemas, biomas e formas de vida, do macro cósmico ao microcósmico: Sistemas estelares nascem e morrem, assim como as florestas, as árvores, as faunas, os animais, as civilizações etc. Os sistemas estelares devem estar distribuídos em um determinado padrão de posição e/ ou de movimento, assim como os planetas têm seus movimentos padronizados por suas órbitas que se relacionam com uma estrela. Nossa estrela, o Sol, relaciona-se com todos biomas da Terra, afetando o clima, causando degelo, inundações ou secas. As florestas e os demais biomas da Terra relacionam-se não só através dos ventos que carregam areia, pólen ou outras partículas entre um e outro, como também relacionam-se com animais que migram de um ponto ao outro. Todas essas trocas relacionadas por plantas e animais relacionam-se com o solo afetando sua composição química também. Por fim, o ser humano é o que mais altera (ou adultera) a composição dos biomas, dos solos, das faunas etc. Em algum nível, tudo relaciona-se. Nada está completamente à parte de tudo. 

Voltando aos corpos maiores como estrelas e buracos negros, sabe-se que eles têm a capacidade de distorcer o espaço-tempo. Tais propriedades devem ter alguma relação com as teorias de dimensões além das três (ou quatro) conhecidas pelo ser humano até então. Confirmando-se estas propriedades, abre-se a chance de entender que as relações mencionadas anteriormente vão além do espaço-tempo, ou seja, além da tridimensionalidade. 

Então, o processo de expansão/ extensibilidade psíquica também pode ter uma relação (como em outros sistemas) com estas dimensões praticamente desconhecidas até então. Isto poderia explicar os inúmeros relatos de experiências transcendentais, sobrenaturais e outras similares a estas. Relatos que se estendem desde a história pré-escrita da humanidade, por todo globo terrestre. 

O mesmo vale para o que é conhecido como alma. Este conjunto de aspectos psíquicos presente nos seres humanos, ou possivelmente, a essência do ser humano, poderia se estender para muito além do que entendemos como vida. 

Todo este texto é descritivo, ou seja, um tanto racional. Isto se deve por se tratar de uma tentativa de mostrar e explicar a relação entre todos estes assuntos tão variados, tidos por grande parte da humanidade, como temas isolados e independentes entre si. Mas, apesar de toda racionalidade, este texto certamente seria considerado como fútil por grande parte da comunidade científica atual. Por enquanto não vou me ater aos possíveis motivos deste julgamento. 

O fato é que essa relação entre assuntos supostamente tão variados entre si, também trata se sentir e de sentimentos, pois também trata desde a empatia de um ser humano até suas relações sociais e o comportamento da sociedade… E muito mais, é claro. Estamos falando de sistemas e de relações. Não de meras medições e quantificações, mas de todos os elementos/ corpos e de suas respectivas relações. E se sentimentos estão nesse processo de expansão/ extensão, em seu ápice, tal processo seria muito vasto. Esta vastidão que se relaciona fisicamente poderia ser chamada de universo ou qualquer coisa assim. Mas no que se diz respeito à inteligência e ao sentimento estamos falando de mente. Uma mente tão abrangente, ou seja, literalmente grandiosa, seria Deus. 

 Com toda essa “viagem”, estou trazendo os sentimentos ao centro de todo um assunto sobre sistemas. Eles existem e se manifestam frequentemente. Estas manifestações as quais podemos chamar de emoções se dão através do que entendemos como matéria, mais especificamente, através dos corpos, como por exemplo, os corpos humanos. Sorrisos, choros, risos, gritos, gestos corporais ou com as mãos, tanto faz. São os meios de manifestação de algo central na existência humana - os sentimentos. Central porque existem há centenas de milhares de anos, desde o surgimento ou desenvolvimento dos homo sapiens, e até mesmo antes disto. Embora as emoções sejam as manifestações, ou seja, as expressões - o que sai através do corpo, sabemos que há mais coisas envolvidas pelos sentimentos. Hormônios saem do corpo pelo ar podendo ser farejados por animais como cães por exemplo. Mas não é só isto: há todos os mecanismos do cérebro e do sistema nervoso: as sinapses e seus impulsos elétricos etc. Mas não devemos confundir estes efeitos e produções com os sentimentos em si. Isto não seria científico. Não seria inteligente nem sábio, nem empático. Seria ignorância ou mera opinião. Entendemos os sentimentos como vários, mas já expliquei rapidamente sobre alguns deles em outros textos. O que quero resumir aqui é: o vazio sendo o mais próximo de uma "não relação" (ou talvez uma “não existência” de algo), na mente humana ele surge para ser preenchido. Não vou falar de um ritmo do qual ele deva ser preenchido, nem de um sentimento específico ou uma possível intensidade deste. Como eu disse em outro texto ( https://amorpelosabersaberamar.blogspot.com/2023/12/o-que-preenche-o-vazio.html ), o sentimento positivo é o naturalmente “querido” ou “desejado”. 

Não estou defendendo a ideia esdrúxula típica de alguns coach, que dizem para as pessoas pensarem positivo o tempo todo, ignorando a realidade ao seu redor. Mesmo porque tais ideias parecem oriundas de uma mistura do pensamento meritocrático pregado no mundo empresarial com o “gratiluz” ou “goodvibes'', o que resulta em uma teologia da prosperidade (deus dinheiro transvestido de conceitos de religiões/ filosofias orientais). Quando cito o necessário para se buscar saúde mental ao preencher vazios, me refiro mais a um conjunto de bons sentimentos demonstrados ou direcionados a alguém que possa respondê-lo de maneira “positiva”. E desta forma, eu definiria o amor como o elemento principal e mais ideal para preencher o(s) vazio(s). Claro, é uma generalização, porque falar dele requer um outro texto, este sim, com profundidade e possivelmente com menos racionalidade. 

 


O Sentimento - Uma realidade menosprezada? 

O ser humano pode ter sentimentos vastos, profundos e bem desenvolvidos, assim como podemos ter conhecimento racional desta mesma maneira. Ter sentimentos desenvolvidos não é sinônimo de suprimir a racionalidade. Alegar que o termo sentimental é pejorativo ou usá-lo como ofensa é uma tolice, pois desta forma um ser racional também seria alguém sem sentimentos ou alguém racional em excesso, portanto seria pejorativo também. E sabemos que não é (ou deveríamos saber). Pois bem, quem é minimamente sentimental deve saber: 

Uma grande afinidade com “coisas” (objetos por exemplo) é apego e afinidade com pessoas é afeto. 

De objetos e locais nós gostamos ou não gostamos, geralmente por experiências físicas, embora seja possível associar o objeto ou local a uma memória. 

Porém para gostar de pessoas é preciso conhecê-las e conhecimento vem do aprendizado. Enquanto o afeto (positivo e mais significante, ou mais intenso) é sentimento que surge após o desejo pela pessoa virar confiança. 

É possível dizer que confiar instantaneamente em um indivíduo é uma questão de acreditar, ou seja, de crença, uma vez que não se conhece tal ser. Nas interações sociais (amizades, namoros etc), a confiança tende a se construir gradativamente enquanto aprendemos a nos relacionar, mas é fácil destruir esta confiança rapidamente, principalmente se há omissão ou mentira no relacionamento. Tais omissões e mentiras aqui referem-se desde a esconder uma opinião, até enganar a outra pessoa para fazer coisas sem esta saber. Assim, o sofrimento da pessoa enganada possivelmente tem uma relação proporcional à quantidade de informações escondidas ou a importância desta “informação”. Quando a confiança que uma pessoa tem em outra é destruída, o afeto positivo "desaba'' e seu impacto causa um sofrimento psíquico que pode ser uma anulação do afeto gerando frieza ou vazio, ou uma inversão que o transformaria em um "afeto" negativo como ódio. Tal possibilidade de destruição dos afetos positivos, não deve nos impedir de manifestar sentimentos. Não deve nos paralisar, nem impedir relações. Sejam elas reconstruções ou novas relações. Como tantas coisas que crescem e morrem, sentimentos como o amor podem renascer quantas vezes for preciso. Não se trata de apego e sim de sentir… 

As pessoas que geralmente desprezam afeto e confiança, talvez porque não tiveram exemplos durante a infância e adolescência, não são necessariamente pessoas más, pois geralmente não sentem prazer no sofrimento alheio. Ao invés disto, tendem a ser materialistas e/ ou predominantemente racionais. As emoções destas parecem menos intensas e mais breves do que aquelas dos mais sentimentais. Como mencionado anteriormente, sentimental aqui não tem significado pejorativo e sim de uma pessoa que tem bastante sentimentos ou tem sentimentos mais intensos. 

Uma vez que o “racionalista” (racional em demasia) tem sentimentos subdesenvolvidos, este deve receber prazer, bens ou serviços nos relacionamentos, caso contrário as relações não valerão a pena. Afinal como mencionado anteriormente, tal pessoa deve priorizar outra coisa além do sentimento nas relações: seja bens materiais, sucesso acadêmico ou profissional etc. Tais pessoas não são máquinas, portanto devem possuir sentimentos, sejam breves ou superficiais. Como os sentimentos são notoriamente diferentes da racionalidade, frequentemente eles devem ser considerados fúteis, bizarros ou ao menos abstratos demais. Portanto a pessoa com esta característica, quando recebe afeto e confiança, não pode ou não quer retribuir, porque afinidade com pessoas tende a ser considerada mero apego e com objetos é real e plausível. Tal pessoa “fria” ocasionalmente pode parecer cruel e até pode se aproximar ou ter algumas atitudes sádicas, mas está mais para insensível. Possivelmente mesmo o termo insensível seja impreciso para definir as pessoas com um profundo vazio afetivo: Como tal característica pode ter origem na tenra infância, período em que se forma um "repertório emocional" do indivíduo, é possível que a pessoa "fria" ou "com vazio" direcione a manifestação de seus sentimentos de forma muito particular/ incompreensível para a maioria das pessoas.

Se este vazio afetivo durar um período significativo na vida da pessoa, ele pode “conceder” alta adaptabilidade ao conflito ou à solidão, uma vez que o indivíduo tende a suprimir a empatia e perder a noção dos benefícios gerados por bons sentimentos e por relações saudáveis. As pessoas com tal vazio (afetivo ou existencial), para não se perderem em meio a apatia ou ao isolamento, podem traçar objetivos buscando sucesso profissional ou conquistas financeiras. Se este vazio gerar anseios frequentes na pessoa, ela pode alegar gostar de uma outra pessoa em pouco tempo de convivência e descartá-la com a rapidez proporcional a (breve) duração de seu sentimento. 

Enfim os sentimentos formam uma condição básica do ser humano e de vários outros animais também, geralmente mamíferos. Como a própria palavra mostra, o sentimento está relacionado ao “sentir” e se manifesta na forma de afeto. Isto pode ter surgido por uma necessidade de sobrevivência, como por exemplo, no caso da relação da progenitora (mãe) com seus filhotes. Embora outros animais tenham se desenvolvido sem esta característica, é notável que a maioria (se não todos) dos mamíferos encontraram esta maneira de sobreviver. 

Por fim, o vazio afetivo que pode gerar problemas como a depressão ou a ansiedade, possivelmente afeta a parte química do corpo, por isto em determinados casos é necessário tratamento medicamentoso. A dúvida que fica é: Os medicamentos não tratam só os efeitos causados pelo vazio? O vazio em si permanece já que o indivíduo se desenvolveu com eles. Portanto, se uma pessoa teve a infância sem afeto da mãe e/ou do pai, ela pode adquirir ou aprender a ter este sentimento por outras pessoas depois de adulta? 

Quando penso sobre sentimento, não me limito às emoções, como felicidade, ódio, tristeza etc. Pois também percebo outra possibilidade: A de sentir intenções e emoções de outras pessoas. Neste último caso sentir está mais para intuir. Esta intuição é uma capacidade muito antiga do ser humano, pois entende-se que tal capacidade foi muito utilizada nas sociedades hominídeas primitivas, uma vez que não tinham a racionalidade muito bem desenvolvida e aplicada para a construção de conhecimento e tecnologia. Juntamente com a intuição, sempre esteve o sentimento, desde os primórdios da humanidade e possivelmente dos mamíferos. Assim pode-se entender que o sentimento é uma característica elementar do ser humano, não podendo deixar de existir de maneira alguma. No máximo ele pode ser suprimido como nos casos mencionados acima, trazendo mais malefícios do que benefícios. Sendo uma característica constituinte/ elementar do ser humano, temos a resposta da questão feita anteriormente: O sentimento pode ser desenvolvido na fase adulta. O quão fácil ou difícil é uma outra questão que irá exigir uma análise de cada indivíduo particularmente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Quem foi o filósofo Sócrates?

Sócrates não deixou obra escrita, pois viveu praticando somente a tradição oral. Relatos sobre o filósofo foram registrados por Xenofonte, A...